quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

por Alessandro Atanes

“A Bienal (...) enfrenta um problema de cultura com boletim de ocorrência”. Desta forma o colunista Jorge Coli, da Folha de S. Paulo, resumiu com precisão no Mais! deste domingo o fato de uma jovem paulistana ter pichado uma parede em branco da Bienal do Vazio, no Ibirapuera, em São Paulo. Caroline Pivetta da Mota, 23 anos, está presa por sua atitude contra o espaço em branco, por ter impresso na parede sua insatisfação com o vazio.

Ediício da Bienal pichado em imagem do blog Eu Aqui

Já tem algumas semanas que o crítico vem se manifestando contra o “conceito” de vanguarda da Bienal (para mim falso, já que isso seria vanguarda nas décadas de 20 e 30, hoje é só arremedo e vazio mesmo), um desperdício de espaço para a arte:

"A dificuldade dos jovens artistas para mostrar o que fazem é enorme. Estão fora do mercado das artes, circuito que se assanha só por valores artísticos lucrativos. Encontram poucos lugares para expor, para debater com outros artistas e com a crítica. Aí, a Bienal exibe acintosamente um enorme espaço vazio, sem falar no pequeno conjunto mal alinhavado de obras do primeiro andar, várias bem pífias.
(...)
As vanguardas se institucionalizaram e afastaram qualquer liberdade não autorizada, que não caiba em sua ordem autoritária e arbitrária".

Neste pequeno texto, me solidarizo com Caroline, que subverteu o vazio.

Ainda o vazio
O subtítulo acima, que empresta continuidade ao tema inicial da coluna, na verdade é o título de uma postagem recente do escritor Marcelo Ariel em seu blog TEATROFANTASMA e se refere ao novo filme dos irmãos Coen, Queime depois de ler, em cartaz, no qual vemos Brad Pitt e George Clooney bem diferentes dos personagens cool de Onze Homens e um Segredo. Sobre esta comédia de erros de face soturna, Ariel escreveu o seguinte:

"No último filme dos Irmãos Coen Queime depois de ler. O vazio e a falta de sentido são as energias que movem a 'realidade' a morte é apenas uma irradiação do vazio que aqui penetra em uma dimensão que os aproxima de Frank Capra, de um Capra leitor de Cioran..."

O vazio do filme não é um vazio cheio de nada como o da Bienal. É, na verdade, um dedo apontado ao vazio, sua denúncia, bem como indica o escritor ao lembrar de Cioran, o filósofo do absurdo.

Como nas melhores obras de arte, isso ocorre por causa da relação entre forma e conteúdo. Explico: como a maior parte das histórias, os filmes se dividem em começo, meio e fim ou, em termos técnicos: situação inicial, desenvolvimento e desfecho, sendo a segunda parte geralmente a mais longa, com cerca de metade da duração, como aponta, por exemplo, Christopher Vogler em A jornada do escritor.

Os irmãos Coen subvertem o esquema: como no filme anterior da dupla, Onde os fracos não têm vez, vencedor do Oscar de 2008, eles adiantam o clímax, que ocorre logo após a metade do filme. É como se a história (começo, meio e fim) terminasse antes do enredo (a seqüência de cenas), nos proporcionando uma grande sensação de vazio, mas também tempo de reflexão (como provam as risadas nervosas do público enquanto um agente da CIA e seu superior tentam entender as motivações e enganos dos personagens).

Dois vazios não poderiam ser tão diferentes como o da Bienal e o de Queime depois de ler.

Referências
Jorge Coli. O país do homem cordial. Mais!, Folha de S. Paulo, 14/12/2008.

Christopher Vogler. A jornada do escritor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

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