terça-feira, 24 de novembro de 2015



Por Norma de Souza Lopes

minha mãe não foi violada na guerra
porque vejo deitar em sacos pretos os corpos de meus tios?
(eu nem tenho tios)
meus irmãos são baleados a todo momento nas esquinas
(crês que não tenho irmão?)
minha madrasta foi violada e arrancaram-lhe os olhos
(não tive pai que me desse madrasta)
em qual momento me tornei puro fragmento
simulacro das dores do mundo?
sofro pois sua sintaxe quebrada não me junta, clarice
lança um silêncio impetuoso na língua que inventas
sentes o pulso da perda olhando fundo na sombra
(eu não)
minha dor é carne rasgada exposta sem vexame
meu silêncio tem parentesco com a morte
ah, clarice, se eu soubesse cerzir
caseava minha alma com palavras

Minibiografia


Norma de Souza Lopes é autora do livro de poemas "Borda" (Patuá, 2014) . É poeta e professora. "Escrever é essa costura cotidiana quando posso tecer e juntar as pontas soltas da memória". Escreve no blogue Norma Din: http://normadaeducacao.blogspot.com.br/


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