quarta-feira, 24 de agosto de 2016

A Angústia, desenho de Antonin Artaud
Por Flávio Viegas Amoreira

A Loucura, Lissa, filha de Nix, deusa primordial saída do Caos, Nix, a Noite de onde o delírio e o éter celestial se originam. Qual ato humano desde Prometeu não foi atribuído à Loucura? Sendo a razão uma âncora que nos ata em meio a um Oceano imaginoso? Onde um vale tão incerto quanto esses onde caminham os que dizem ser a Verdade? A Arte então de Apolo irada lira, é a Loucura consentida desde que fugaz e distração provisória: então loucos façamos da Vida um experimento ensandecido de harmonia com a comédia ou drama, desde que criando na ilusão de permanência cotidiana o desvelamento doido do encanto do infinito.

Desde babilônicos tempos a forma teima em domar os loucos rebentos : o Caos não findou ao sétimo Dia : o Caos é enorme ovo de galinha forjando novos céus em dias de ensandecida ventania. "Só posso crer num Deus que dança", disse o mestre : se matarmos Nietzsche em nós que Deus então estará entre nós criando? Posso crer em qualquer coisa, desde que seja absolutamente inverossímil! Um poeta que habite a realidade só pode ser um louco travestido com hábitos de bom moço civilizado. Toda Arte pede uma Vida instigante e experimentada : romper os fios de marionetes costumizados, eis a missão de quem tem por obra num asteróide perpetuar-se. Como um bólido subvertendo a trajetória lunática de minha estrela, poeta, faço e desfaço o que por tudo-todo invento.

Distinguimos melhor os objetos distantes que os próximos : a realidade anunciada pelo burguês careta é tão óbvia que só posso mirar o impossível que carrego como cajado na ressuscitada vereda parida do casamento infame do sagrado e do profano. Todo preconceito cesse, eu que teço os manuscritos dos sábios de Sodoma e de Urano: toda verdade jaz submersa dormindo sob o pesadelo da consciência habituada ao corriqueiro cotidiano. Quem ama deve um querer sem causa imediata ou pensado fruto: a loucura perpassa toda grande obra, gesto, expande-se no grito ou no silenciado olhar distanciado do mesquinho horizonte. Loucura visionária, loucura criativa, loucura desvairando além da palavra usual e do mais comum dos termos: o que não foi nem nunca estancará! O voo de Nijinsky, a dor de Artaud pelo excesso de sentimento e duas cenas que marcaram minha loucura cristalizada em literatura : Norma Desmond encerrando Sunset Boulevard (Crepúsculos dos Deuses) e Aschenbach sucumbindo loucamente à Beleza em Morte em Veneza : SÓ OS LOUCOS SABEM REALMENTE AMAR...

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